Da aprovação da lei municipal ao sabonete de óleo de babaçu, produto de valor agregado com marca “Babaçu Livre”, passaram-se 30 anos de luta, resistência e, acima de tudo, de direitos conquistados pelo protagonismo das mulheres agroextrativistas da região do Médio Mearim no Maranhão.
São três décadas de histórias em defesa do meio ambiente, da vida e de luta por direitos das mulheres quebradeiras de coco babaçu, extrativistas e do campo, organizadas por meio da Associação de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Lago do Junco e Lago dos Rodrigues-MA (AMTR), que completou 30 anos de fundação no dia 14 de maio. A aniversário será comemorado neste sábado (18/05), às 9h, na escola Familiar Agrícola Familiar Agrícola Antônio Fontenele, no povoado de São Manoel, no município maranhense de Lago do Junco, a 300 quilômetros de São Luís.
As mulheres da AMTR trabalham na quebra do coco babaçu e vendem a amêndoa para a produção do óleo, que retorna à sua fábrica de sabonete, localizada na comunidade de Ludovico. A fabricação do sabonete de babaçu está em plena produção e deve alcançar o volume de 40 mil unidades este ano – 10 mil a mais do que o produzido em 2018.
“O trabalho da associação é pela renda familiar, pela defesa do meio ambiente e do acesso livre aos babaçuais. O sabonete é um produto fruto da nossa resistência para conter a derrubada das palmeiras de babaçu. Mas, do babaçu se aproveita tudo, da palha à raiz”, diz a presidente da AMTR, Maria das Dores Vieira Lima, quebradeira de coco babaçu conhecida como Dôra, ressaltando entre outras bandeiras defendidas a educação do campo por meio das escolas familiares agrícolas, as EFA´s, de ensino fundamental e médio que conseguiram implantar na região, além da produção de alimentos sem agrotóxicos por meio de boas práticas agroflorestais, tendo alcançando reconhecimento pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social em 2018.
A AMTR é uma das sócias da Associação em Áreas de Assentamento no Estado do Maranhão (Assema), que orientou por meio de consultoria técnica a implantação da fábrica de sabonete e também desenvolve estratégias de combate ao desmatamento na Amazônia Maranhense, com apoio do Fundo Amazônia. “Este trabalho visa o fortalecimento de atividades produtivas sustentáveis na região, entre elas, o agroextrativismo do babaçu e o manejo florestal”, explica o coordenador geral da Assema, Raimundo Ermino.
Outras duas conquistas marcam a história da AMTR. Uma foi a criação do Dia das Quebradeiras de Coco Babaçu (24 de setembro), instituído por lei, uma conquista junto com o Movimento interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB). A outra foi a criação da Lei Babaçu Livre, aprovada em 1997 em Lago do Junco, que garante às quebradeiras de coco do município e às suas famílias o direito de livre acesso e de uso comunitário dos babaçus (mesmo dentro de propriedades privadas), além de impor restrições significativas à derrubada das palmeiras. Na época, as quebradeiras de coco babaçu chegaram a ter uma representante na Câmara Municipal de Lago do Junco, a vereadora Maria Alaídes de Sousa, sócia fundadora da AMTR e atual coordenadora do MIQCB, com abrangência nos estados do Maranhão, Pará, Piauí e Tocantins.
“Temos uma palavra forte no nosso meio que é resistência”, diz Maria Alaídes, ressaltando que a AMTR é um grande espaço de conquista das mulheres. “Na associação definimos nosso papel como mulher e com várias atividades. E nós não estamos cansadas, não. Estamos aqui para dar sequência à nossa história”, afirma.
A marca Babaçu Livre é uma referência a décadas de luta e resistência para terem acesso aos babaçuais numa região antes marcada por grilagem, conflitos de terras, mortes e entraves ao extrativismo. Por isso, o sabonete de babaçu é considerado um símbolo de luta em defesa dos babaçuais e um resgate do conhecimento tradicional das quebradeiras de coco babaçu no Maranhão. “Começamos a nos reunir em clubes de mães, incentivados pela igreja. Aí percebemos que tínhamos os mesmos problemas, mas acima de tudo, tínhamos direitos. Então nos unimos em defesa dos babaçuais para impedir a derrubada e resgatamos o sabão de babaçu que nossos pais faziam no passado para mostrar que o nosso trabalho tinha valor”, conta a dona Nazira Pereira da Silva, sócia e fundadora da associação.
Estima-se que existam cerca de 400 mil mulheres quebradeiras e coco babaçu no Maranhão, Pará, Piauí e Tocantins, onde está a maior concentração das florestas de babaçuais no país, numa área de convergência entre o Cerrado e a Floresta Amazônia.
A luta das mulheres de Lago do Junco e Lago dos Rodrigues teve ainda como reflexo a permanência de famílias, com destaque para a juventude, morando no campo. “Hoje o campo tem mais pessoas do que a zona urbana. Isso é fruto da resistência que tivemos para permanecer nas terras onde nascemos”, observa Dôra.